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«Ponho fim a uma vida que me pareceu conter todas as grandezas, e não vi conter senão a incapacidade de as querer.» (in A Educação do Estóico, do Barão de Teive)
E eis-me regressado a Pessoa, uma vez mais; é que este leitor, de quando em quando, sente necessidade de regressar a tal autor - e sendo a sua obra édita tão múltipla, há sempre imensas faces para redescobrir. (Podia acrescentar, em tom de brincadeira, que por mais que percorra a obra pessoa nunca descobri o tal texto - absurdamente medíocre, de autoajuda rasteirinha - que termina da seguinte forma: «Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo...»).
Porque Pessoa é, sem dúvida, uma das grandes personalidades literárias mundiais - talvez a maior aqui do retângulo, por muito que as décadas de setenta e oitenta, à custa de tantos inéditos e descobertas no espólio, bem como da entrada em força nos currículos escolares, tenham levado a uma espécie de "enjoo pessoano"... (que, aliás, de alguma forma se prolonga, ou não fosse frequente ouvir políticos de carreira e outros personagens anti-culturais a citar, de peito inchado, um "quando a alma não é pequena" ou um "o poeta é um fingidor"); porque a sua obra vale a pena ler e reler, e reler, e reler; porque, por mais que se conheçam de cor pedaços dela, há sempre muito para admirar.
Feita a "hagiografia" - necessária, justa, apesar de não gostar de tais discursos -, resta-me dizer que retirei muito prazer da releitura de A Educação do Estóico (O Único manuscrito do Barão de Teive), uma das muitas obras fragmentadas e incompletas do espólio de Pessoa. Organizada pelo estudioso Richard Zenith (autor, por exemplo, de uma fotobiografia pessoana), a sequência construída do texto pessoano procura aproximar temáticas comuns, para resultar numa certa lógica.
Este "único manuscrito" é, segundo as palavras do Barão, uma "memória intelectual", um testamento da sua vida, prestes a ser terminada pelo suicídio, após ter queimado todos os seus escritos («(...) trechos já completos para obras que nunca escreveria»). Como se vê, Teive partilha com Pessoa esta incapacidade de levar até ao fim os seus escritos, de lhes dar forma definitiva; a justificação dada pelo aristocrata remete para o seu perfecionismo, que, aliás, lhe toldava todas as outras ações além da escrita. Tal como o seu autor, o Barão de Teive recusa o amor (e a vida sexual) por ter "escrúpulos" em afetar o outro. Vários são, tal como acontece com o Bernardo Soares do Livro do Desassossego, os pontos de contacto com aquilo que é possível apreender da forma de pensar de Pessoa.
Quanto aos Aforismos e Afins, o interesse é mais relativo, pois se trata somente de uma selecta de fragmentos entre as muitas que se poderiam constituir. São, se se quiser, uma via preguiçosa de acesso à obra do autor português.
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