terça-feira, 20 de setembro de 2016

"Maigret & A Noite da Encruzilhada", de Georges Simenon

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Após a leitura deste A Noite da Encruzilhada, dou-me feliz pela persistência: achei este livro um pouco mais cativante que os anteriormente lidos (Pietr, o Letão e O Enforcado da Igreja).
Desta feita, o comissário Maigret vê-se confrontado com um caso estranho em que ninguém é aquilo que aparenta. Depois de um longo interrogatório, Carl Andersen, um aristocrata dinamarquês, continua impassivelmente a reclamar a sua inocência: o automóvel de um vizinho aparecera na sua garagem com um morto, que trabalhava em diamantes. Maigret rapidamente segue para a Encruzilhada das Três Viúvas, onde, além de Carl Andersen, existem a casa de um agente de seguros e uma garagem; ao longo da sua investigação no local, o comissário começa a perceber que, no comportamento dos vários intervenientes, há qualquer coisa de farsa.
Na contracapa do livro faz-se referência a um filme de Jean Renoir inspirado neste livro - fiquei um pouco tentado a procurar vê-lo no futuro.

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

"Morte em Veneza", de Thomas Mann

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Após do arrebatamento provocado pel'A Montanha Mágica, havia que regressar a Morte em Veneza, lido há bastante tempo. Devo confessar que a ideia que tinha desta novela era tremendamente difusa; ainda assim, sabia ter ficado bastante bem impressionado.
A releitura confirmou tratar-se de uma pequena obra-prima, em que estão presentes a escrita de Mann - rica, elaborada, precisa, culta -, o tom elevado das sua reflexões de caráter mais abstrato (sobre arte, a beleza, etc.) e o colorido das suas descrições (tão visível, por exemplo, na sua descrição do nascer do sol),
A história é extremamente simples (e, como é sabido, foi brilhantemente adaptada ao cinema pelo meticuloso Visconti): trata da paixão homossexual de Gustav Aschenbach, um melancólico e austero homem de meia idade alemão, e consagrado escritor, por um adolescente de comprido e claro cabelo encaracolado (Tadzio), numa estância de férias em Veneza. Aschenbach vê no jovem a "beleza perfeita", e por ela se deixa embriagar, contrariando a sua austera racionalidade, que lhe mostra o caratér impróprio do seu amor platónico (especialmente se se considerar a moralidade da alta burguesia de fim de século) e a necessidade de partir para salvaguardar a saúde (quando se apercebe dos ares pouco salubres, ou mesmo epidémicos, de Veneza). A descrição do desassossego do protagonista, bem como das suas ânsias próprias do sentimento amoroso, é, a meu ver, absolutamente exemplar.
Achei tremendamente curioso um aspeto que me remeteu para a nossa atualidade: o modo como as autoridades locais "encobrem" a epidemia, menorizando, para tentar minimizar o impacto económico (turístico).

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

"Maigret & O Enforcado da Igreja", de Georges Simenon

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E duas semanas depois da "estreia", eis que reincido na leitura de Simenon. Procurei, de entre os que tinha à disposição, um dos mais antigos (Maigret & O Enforcado da Igreja, o quarto da série "Maigret", publicado em 1931), uma vez que tenciono, de quando em quando (intercalando com leituras mais exigentes), ler um dos numerosos (mais de oitenta, ao que sei) volumes dedicados às investigações do comissário da Polícia Judiciária francesa.
Tal como o livro anteriormente lido, a história (bem assim como a escrita) de Maigret & O Enforcado da Igreja é relativamente simples: desta feita, Maigret tropeça casualmente em território belga no percurso de um sujeito que lhe parece suspeito; ao segui-lo até território alemão, acaba por interferir com o percurso do tal indivíduo (trocando-lhe a maleta que carregava, contendo um fato com vestígios de sangue), levando-o ao suicídio com um tiro na boca. As investigações de Maigret levam-no à descoberta da identidade verdadeira (pois usava um nome falso) e a tropeçar em vários compatriotas seus e numa história que acontecera vários anos antes.
Pessoalmente, e de novo, não posso dizer ter ficado encantado com esta obra, por ser algo básica, tanto ao nível do enredo (da investigação), como a nível literário. Ainda assim, há que dizer que, se não foi uma leitura propriamente enriquecedora, pelo menos proporcionou-me uns momentos entretidos (superficiais?) de leitura descontraída.

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

"Marc Bloch. Uma Vida na História", de Carole Fink

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Ao amigo Filipe
 
Esta biografia foi-me recomendada há quase vinte anos por um figurão do mundo académico numa conversa de corredor, a seguir à aula a que assistiam apenas dez alunos; após essa conversa, tropecei duas ou três vezes no livro em feiras do livro barato, mas, após folheá-lo, nunca senti suficiente interesse para comprá-lo. Talvez a capa, demasiado inexpressiva, também tivesse contribuído para a rejeição... Certo é que o descartei, como tantos e tantos livros que me foram sugeridos (ou que nalgum momento me interessaram) ao longo dos anos...
Ora, há umas semanas atrás, estando a ver um documentário em que se fazia referência à intervenção de intelectuais (sobretudo escritores e artistas plásticos) na Resistência Francesa contra a dominação nazi, lembrei-me que Marc Bloch havia sido um intelectual (neste caso um académico judeu) que morrera por ter preferido lutar como elemento da Resistência. Daí a verificar se a sua biografia, da autoria de Carole Fink, existia na biblioteca local foi apenas um momento. E, é caso para dizer, ainda bem que uma coisa levou à outra, e eu me predispus a levantar o livro, a trazê-lo para casa e a iniciar empenhadamente a leitura!
Porque Marc Bloch. Uma Vida na História é uma biografia que, a muitos títulos, vale a pena ler. O biografado é uma figura de interesse: um intelectual brilhante (enquanto historiador procurou inovar metodologicamente e acentuar a necessidade de espírito crítico, mostrando um interesse precoce pela história das mentalidades) mas também um resistente em tempos de luta pela liberdade do jugo nazi. Por outro lado, o discurso biográfico é claro, acessível e muito bem estruturado; segue uma ordem cronológica (é, assim, algo conservador), cruzando o percurso do biografado com vários níveis (mais gerais ou mais particulares) de contextualização.
A biografia de Carole Fink perpassa pelos momentos mais importantes da vida de Bloch: o seu percurso formativo como jovem historiador (filho de um historiador do período clássico, Bloch seguir-lhe-á as pisadas e, enquanto termina o seu doutoramento, já finda a guerra, ensina na refundada Universidade de Estrasburgo); o seu papel como militar na Primeira Guerra Mundial (destacou-se como oficial, chegando ao posto de capitão); as suas conquistas académicas (as suas principais obras - Os Reis Taumaturgos, A Sociedade Feudal ou Introdução à História -, são objetos de particular atenção, chamando-se atenção para as suas virtudes sem omitir as suas limitações ou mesmo fragilidades); o seu papel de cofundador dos Annales, em 1929, conjuntamente com Lucien Febvre (revista de bastante relevo no âmbito da historiografia, pelo que pretendeu inovar - saindo da história tradicional, quer era sobretudo política, procurando novas perspetivas multidisciplinares, apostando em temas contemporâneos, etc.), a sua participação na Segunda Guerra Mundial (desta vez como derrotado, tendo assistido à derrocada do exército francês e estado presente no célebre episódio da evacuação de Dunquerque), a sua passagem pela República de Vichy (território francês não ocupado pelos nazis durante a guerra, governado autoritária e cooperativamente com os alemães) e reação à política antissemita aí praticada (chegou a procurar refúgio para si e para a sua família nos Estados Unidos, mas tal nunca se concretizou; dado o seu prestígio, e apesar da segregação dos judeus, conseguiu manter-se no ensino superior até não haver mais condições); e, por fim, a sua adesão e participação na Resistência (desempenhou um cargo dirigente em Lyon, onde viveu na clandestinidade, acabando por ser capturado pela Gestapo, torturado e morto em 1944, dez dias depois do desembarque aliado na Normandia).
Por tudo o que escrevi, posso dizer que este livro foi um agradável surpresa; muito me congratulo por ter resgatado este livro, que li relativamente em pouco tempo. Ainda que tenha a noção que Introdução à História é uma obra algo divagante, talvez porque elaborada em grande medida de memória (Bloch erigiu-a sem recurso à sua biblioteca, que havia sido confiscada pelos nazis), fiquei um pouco tentado a regressar a ela. Logo se verá.