sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

"Viagem à Volta do Meu Quarto", de Xavier de Maistre

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«Que viaje à roda do seu quarto quem está à beira dos Alpes, de Inverno, em Turim, que é quase tão frio como Sampetersburgo - entende-se. Mas com este clima, com este ar que Deus nos deu, onde a laranjeira cresce na horta, e o mato é de murta, o próprio Xavier de Maistre, que aqui escrevesse, ao menos ia até o quintal.» (in Almeida Garrett, Viagens na Minha Terra)
Se Garrett inicia a sua paradigmática obra citando (com refinado humor, assinale-se) Xavier de Maistre, é porque a obra Viagem à Volta do Meu Quarto (publicada originalmente em 1794) era, em meados do século XIX, tida como uma referência literária, pela sua graça e caráter original.
Efetivamente, e como destaca Pedro Mexia no prefácio deste volume, Maistre constrói o "paradoxo da viagem imóvel" - mas até que ponto será possível viajar no confinamento de quatro paredes (neste caso, o narrador/autor encontra-se em prisão domiciliária, num quarto em Turim, situação que se prolongará por cerca de 40 dias)? O narrador defende e recomenda o seu modelo de viagem, por não implicar custos, riscos ou esforços; além disso, transforma o seu impedimento (em sair daquele espaço) em oportunidade - a prisão torna-se um refúgio que permite enveredar por uma viagem interior. O discurso é, assim, deambulatório, reflexivo, ainda que não muito profundo.
Expedição Noturna à Volta do meu Quarto foi escrito anos mais tarde, ainda que publicado apenas em 1825. Ainda que seja um texto independente, é uma continuação do anterior. Desta vez, porém, a viagem é voluntária e limitada a quatro horas (das oito da noite à meia-noite), o quarto (alugado) é efetivamente um refúgio, um eremitério, um local para se isolar do mundo. O tom acaba por ser um tanto diferente, por vezes mais melancólico, outras mais fantasioso.
Esta obra acaba por ter alguns pontos de contacto com, por exemplo, a obra de Sterne, A Vida e Opiniões de Tristram Shandy, nomeadamente na forma como dialoga provocadoramente com o leitor; há ainda uma certa afinidade no humor. Por tudo isto, era difícil não me agradar. 

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