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Na sequência da leitura de D. Sancho II. Tragédia, de Hermenegildo Fernandes, urgia (pela modo como os percursos destes dois reis estão ligados) a leitura da biografia de (seu irmão) D. Afonso III, desta vez da autoria de Leontina Ventura (e co-autoria, um vez que é responsável por um capítulo de dimensão considerável, de António Resende de Oliveira) - obra, desde já o declaro, de leitura muito mais escorreita que a anterior, com uma linguagem mais arejada e uma estrutura francamente amigável.
O livro divide-se, assim, em quatro partes: na primeira, capítulo que considerei muito bem montado (por fazer justiça às várias sensibilidade e interpretações), a autora faz uma revisão às representações historiográficas do biografado ao longo dos séculos (desde a literatura senhorial até à historiografia contemporânea) - de restaurador (da paz e boa governança), D. Afonso III foi apodado de usurpador e ambicioso (por exemplo, com Alexandre Herculano), e, mais recentemente, como fundador do Estado Moderno (segundo José Mattoso). As segunda e terceira parte aparecem encadeadas e conjugam a sequência cronológica (a segunda parte é dedicada ao período anterior à chegada ao poder de Afonso, enquanto que a terceira se refere aos anos em que foi rei) com a abordagem temática (a centralização do poder, seus órgãos e modos de atuação; os conflitos com a Igreja; etc.).
Por contraste com o de D. Sancho II, o reinado de D. Sancho III caracteriza-se por uma avultada documentação proveniente da chancelaria régia, que a autora utiliza como via para nomeadamente aceder aos aspetos administrativos e legislativos. Se o período em que Afonso reinou é rico em informação (não apenas, claro está, emanada da sua própria chancelaria; e apesar da inexistência de quaisquer crónica coeva dedicada a esse monarca), o conhecimento relativo à sua infância e juventude é bastante lacunar (não estando Afonso destinado a reinar, terá saído cedo do reino, passado pela corte francesa, acabando por casar com Matilde de Boulogne e adquirir o título condal).
O conhecimento do seu percurso ganhar contornos mais nítidos a partir do momento em que, dado o clima de instabilidade vivido em Portugal, o Papa depõe Sancho II e exorta à obediência ao conde de Bolonha; ultrapassada a guerra civil, D. Sancho II é efetivamente deposto (acabando por sair do país e morrendo no exílio toledano em 1248) e D. Afonso ascende a rei (todo este tema, também tratado por Hermenegildo Fernandes, é, a meu ver, tratado de forma bem menos barroca por Leontina Ventura). Com o reinado do novo monarca, finda-se a conquista do Algarve (obrigando a, durante vinte anos, a gerir diplomaticamente a questão da soberania do território com o rei de Castela), e dá-se início à reorganização administrativa do reino (já toquei a questão da organização da chancelaria régia, mas posso acrescentar a preocupação com o povoamento, com a articulação económica do território, com o cadastro das propriedades e o levantamento de usurpações, com a cobrança dos réditos régios, com a prática da justiça, etc.).
Na última parte, exploram-se outros aspetos característicos do reinado de D. Afonso III: a constituição da sua corte (os cargos, principais figuras, etc.); a família régia (de novo se aborda a questão do abandono e repúdio de Matilde de Boulogne e a situação de bigamia - o rei acabaria por casar, "por razões de Estado", com D. Beatriz de Castela, de quem teve significativa descendência), os relacionamentos extraconjugais (e resultantes filhos bastardos) e laços de proximidade; e, por fim, o ambiente cultural e as distrações na corte afonsina (num capítulo de bastante interesse, António Resende de Oliveira faz uma revisão da produção literária cortesã e elabora pertinentes considerações históricas a partir, nomeadamente, do cancioneiro galaico-português).
Para encerrar a obra, a autora reproduz um fonte entretanto descoberta (aparentemente inédita): uma descrição coeva de Afonso III por um franciscano da corte castelhana.
O livro divide-se, assim, em quatro partes: na primeira, capítulo que considerei muito bem montado (por fazer justiça às várias sensibilidade e interpretações), a autora faz uma revisão às representações historiográficas do biografado ao longo dos séculos (desde a literatura senhorial até à historiografia contemporânea) - de restaurador (da paz e boa governança), D. Afonso III foi apodado de usurpador e ambicioso (por exemplo, com Alexandre Herculano), e, mais recentemente, como fundador do Estado Moderno (segundo José Mattoso). As segunda e terceira parte aparecem encadeadas e conjugam a sequência cronológica (a segunda parte é dedicada ao período anterior à chegada ao poder de Afonso, enquanto que a terceira se refere aos anos em que foi rei) com a abordagem temática (a centralização do poder, seus órgãos e modos de atuação; os conflitos com a Igreja; etc.).
Por contraste com o de D. Sancho II, o reinado de D. Sancho III caracteriza-se por uma avultada documentação proveniente da chancelaria régia, que a autora utiliza como via para nomeadamente aceder aos aspetos administrativos e legislativos. Se o período em que Afonso reinou é rico em informação (não apenas, claro está, emanada da sua própria chancelaria; e apesar da inexistência de quaisquer crónica coeva dedicada a esse monarca), o conhecimento relativo à sua infância e juventude é bastante lacunar (não estando Afonso destinado a reinar, terá saído cedo do reino, passado pela corte francesa, acabando por casar com Matilde de Boulogne e adquirir o título condal).
O conhecimento do seu percurso ganhar contornos mais nítidos a partir do momento em que, dado o clima de instabilidade vivido em Portugal, o Papa depõe Sancho II e exorta à obediência ao conde de Bolonha; ultrapassada a guerra civil, D. Sancho II é efetivamente deposto (acabando por sair do país e morrendo no exílio toledano em 1248) e D. Afonso ascende a rei (todo este tema, também tratado por Hermenegildo Fernandes, é, a meu ver, tratado de forma bem menos barroca por Leontina Ventura). Com o reinado do novo monarca, finda-se a conquista do Algarve (obrigando a, durante vinte anos, a gerir diplomaticamente a questão da soberania do território com o rei de Castela), e dá-se início à reorganização administrativa do reino (já toquei a questão da organização da chancelaria régia, mas posso acrescentar a preocupação com o povoamento, com a articulação económica do território, com o cadastro das propriedades e o levantamento de usurpações, com a cobrança dos réditos régios, com a prática da justiça, etc.).
Na última parte, exploram-se outros aspetos característicos do reinado de D. Afonso III: a constituição da sua corte (os cargos, principais figuras, etc.); a família régia (de novo se aborda a questão do abandono e repúdio de Matilde de Boulogne e a situação de bigamia - o rei acabaria por casar, "por razões de Estado", com D. Beatriz de Castela, de quem teve significativa descendência), os relacionamentos extraconjugais (e resultantes filhos bastardos) e laços de proximidade; e, por fim, o ambiente cultural e as distrações na corte afonsina (num capítulo de bastante interesse, António Resende de Oliveira faz uma revisão da produção literária cortesã e elabora pertinentes considerações históricas a partir, nomeadamente, do cancioneiro galaico-português).
Para encerrar a obra, a autora reproduz um fonte entretanto descoberta (aparentemente inédita): uma descrição coeva de Afonso III por um franciscano da corte castelhana.
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