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Uma das melhores coisas que me pode acontecer enquanto leitor é tropeçar num livro ou num autor e descobrir algo surpreendente. Eu já conhecia Papini de nome, mas de forma muito vaga, sem qualquer ideia sobre a sua peculiaridade literária. Por isso, quando este livro, O Espelho Que Foge, me chegou às mãos, não sabia o que ia encontrar. Certo: este livro pertence a uma famosa coleção dirigida por Jorge Luis Borges, nome incontornável da literatura do século vinte; mas tal, só por si, não garante nada - afinal, Borges considerou excecional Pedro Páramo, de Juan Rulfo, uma novela que não me encantou especialmente...
Com este O Espelho Que Foge, porém, outra coisa aconteceu: não apenas fiquei fascinado com a intensidade dos contos de Papini, como em certas passagens cheguei a entender o destaque dado pelo autor de Ficções - há qualquer coisa (o quê, não sei bem precisar) em comum entre os dois autores (pesem embora as devidas distâncias).
Os dez contos deste volume partilham uma mesma ambiência (e daí haver, na minha opinião, um certo equilíbrio e congruência entre as várias histórias): não apenas todos são escritos na primeira pessoa (narrador esse que explícita ou implicitamente é um literato), como os temas dominantes se vão repetindo: a passagem do tempo e a decadência (o amadurecimento, o envelhecimento, a aproximação da morte), a desesperança, o tédio e a angústia de viver (há, claramente, em Papini uma perturbadora inquietude existencial), a procura da identidade e a solidão de cada indivíduo, a possibilidade do suicídio como via aceitável e higiénica para sair de cena. O pessimismo é, pois, quase omnipresente neste conjunto de contos; a escrita de Papini, dura e incisiva (frases curtas, sem floreados), acompanha esse tom desolado e sombrio.
Seguramente que regressarei a este livro, uma das descobertas deste ano. Papini, embora só lhe conheça esta obra, passou a ter um ou outro contorno, suficientes para o reconhecer e ambicionar conhecer melhor.
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