domingo, 19 de outubro de 2014

"Don Juan", de Gonzalo Torrente Ballester

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Não acho estranho que o senhor ande um pouco aparvalhado; mais ainda, é até razoável. Como se caminhasse por uma estrada e desse de caras, de repente, com dom Quixote. (in Gonzalo Torrente Ballester, Don Juan)
De uma maneira geral, não sou muito adepto da revisitação de personagens ou histórias "clássicas" por autores modernos. Sendo eventualmente uma opção "fácil" para iniciar um romance, o resultado nem sempre é feliz (na maioria dos casos que conheço fica aquém das versões originais). Porém, neste D. Juan, personagem carismática da literatura espanhola (a par de D. Quixote), não posso fazer qualquer juízo comparativo por não te lido a obra de Tirso de Molina (1579-1648), criador do mito don juanino.
O que quanto muito posso dizer é que Ballester escreve de um modo que acho delicioso, pautado por um humor muito característico - algo como uma ironia com qualquer coisa de pícaro (quando, por exemplo, Ballester descreve a vida no Paraíso, Eva desculpa-se com uma dor de cabeça para não fazer amor com Adão...).
Don Juan não é um mero revisitar da história desse personagem, mas antes uma quase brincadeira literária. O narrador, um literato espanhol numa Paris em tempos de devoção a Sartre, tropeça com Leporello, criado de D. Juan - ou talvez com alguém que se faz passar por tal -, que lhe pretende contar a "verdadeira" história do seu amo, ou seja, uma versão que nem os escritores nem os estudiosos e académicos haviam conseguido captar em toda a sua subtileza. O narrador, no entanto, revela ser um cético - tratar-se-á Leporello de um mero farsante?, os seus estranhos procedimentos não serão uma impostura? Tal como Ballester nos "avisa" no prólogo, esta é uma história de contornos fantásticos, em que até entra o diabo. Misturando diversos estilos narrativos, Ballester transporta-nos ao "Siglo de Oro" num divertido (repito a ideia acima escrita) jogo literário.
Havia lido este livro há muitos anos, já mal me lembrando do conteúdo e da forma. A releitura foi uma aposta ganha e a par dela ficou a vontade de, a muito breve prazo, me lançar noutros obras do mestre Ballester.

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